terça-feira, 8 de setembro de 2015

Crítica Escrita por Kil Abreu no 30º FESTIVALE

“Hoje em espetáculo!” / Grupo Rosa dos ventos – Presidente Prudente, SP...

A tradição e o espírito livre do circo, por Kil Abreu

“Hoje tem espetáculo!”, que o grupo Rosa dos Ventos, de Presidente Prudente, apresentou no Festivale faz acontecer o diálogo entre o circo tradicional (“números, entradas e piadas vistos há pelo 
Foto de André Daffara
menos duzentos anos”) e a sua experimentação no calor da hora dos tempos atuais. Sem propriamente inventar novas formas para a cena cômica, a trupe se dedica a fazer valer um repertório colhido nas convenções da arte do palhaço - o que não é pouco do ponto de vista da tarefa artística que se coloca. Pois que aqui se trata de uma linguagem cujos códigos têm vida longa e se mostram mais ou menos efetivos não necessariamente em função da novidade formal, mas do espírito vivo do clown que anima o ato, ainda que ele seja a repetição de ações que vêm “das antigas”.

O que talvez caracterize especialmente os artistas prudentinos é a reunião deliberadamente tumultuada de todos eles em cena. A ponto de nos primeiros dez minutos de espetáculo nos perguntarmos se as intervenções se baseavam em um tumulto proposital ou se explicitavam apenas o trabalho de uma direção pouco atenta. A amplificação desmedida do som no ginásio do Sesc, mais o fato de temos uma trupe da palhaços “faladores”, ajudou a afirmar esta impressão de uma palhaçaria talvez por demais estridente. No entanto, no decorrer da encenação vamos notando que acidentalmente ou não a indisciplina no andamento e até mesmo a falta de respiro do espetáculo talvez desenhem uma marca do grupo, que mesmo sob estas condições consegue manter a plateia fiel à sequência de números e entradas.

O repertório, como se disse, vem do circo tradicional, matizado com o sabor da linguagem de agora em trocadilhos de dupla conotação, improvisos em torno de fatos e situações ligadas ao comportamento da plateia ou da vida coletiva e etc. Se de um lado temos uma “reprise” clássica como a que satiriza o número do atirador de facas (uma das melhores sequências) , por outro temos uma série de entradas que ganham nova dinâmica quando amparadas em habilidades como os jogos com malabares, que o grupo domina bem. Na área das atuações é possível se divertir com as diferentes máscaras, cada clown agarrando a sua própria – do “organizador” que tende ao autoritário patético ao esperto que se faz tomar por ingênuo, ou ao ingênuo de fato. Todos os tipos, sem exceção, bem desenhados e fazendo valer os contrastes que motivam parte importante dos efeitos cômicos.

Foto de André Daffara

Para arrematar a boa performance dos palhaços prudentinos há ainda a fundamental marcação de uma sonoplastia atenta, que a um tempo ajuda a dar gás à bagunça e a outro a organiza, regendo o ritmo das sequências para que o espírito do improviso livre não acabe por render a cena a um caos de bom efeito, mas indiferenciado. Artistas populares com excelente domínio do tablado, estes do Rosa dos ventos (Fernando Ávila, Gabriel Mungo, Tiago Munhoz, Luis Valente, Robson Toma) souberam fazer do espetáculo um momento em que a tradição do circo não vale “por si”. É a base que favorece um algo fresco e vivo, que começa no jogo alegre do grupo e sem dúvida contagia a plateia.

KIL ABREU é jornalista, crítico e curador de teatro do Centro Cultural São Paulo

Fonte: https://www.facebook.com/fccrsjc/photos/a.359013527505115.80113.146170118789458/900698900003239/?type=1

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